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quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Células suicidas podem ser a melhor forma de cura para o câncer

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O mecanismo para nos proteger do câncer pode estar dentro de cada célula do nosso corpo, de acordo com um novo estudo. Os cientistas descobriram que pequenas moléculas de RNA, originalmente desenvolvidas como uma ferramenta para estudar a função dos genes, desencadeiam um mecanismo escondido em cada célula do corpo que força a célula a cometer suicídio.

Segundo os autores do estudo, esse mecanismo de suicídio de células pode potencialmente ser desenvolvido em uma nova forma de terapia do câncer

Células cancerosas tratadas com essas moléculas de RNA nunca se tornaram resistentes a elas, porque elas simultaneamente eliminam múltiplos genes que as células cancerosas precisam para sobreviver. “É como cometer suicídio esfaqueando a si mesmo, atirando em si mesmo e pulando de um prédio ao mesmo tempo. Você não pode sobreviver”, compara em um comunicado à imprensa publicado no ano passado no site Eurekalert o cientista da Universidade Northwestern, nos EUA, e principal autor do estudo, Marcus Peter.

Proteção ancestral

Peter e sua equipe descobriram sequências no genoma humano que, quando convertidas em pequenas moléculas de RNA de cadeia dupla, desencadeiam o que acreditam ser um interruptor ancestral das células para prevenir o câncer.

“Acreditamos que é assim que organismos multicelulares eliminavam o câncer antes do desenvolvimento do sistema imunológico adaptativo, que tem cerca de 500 milhões de anos. Pode ser um cofre contra falhas que força as células nocivas a cometerem suicídio. Acreditamos que é ativo em todas as células que nos protegem do câncer”, explicou Peter na época.

Mas os pesquisadores ainda precisavam determinar como o corpo produz as moléculas de RNA, chamadas de siRNAs, que podem desencadear o suicídio das células cancerígenas. Esse avanço veio em outro estudo, publicado no mês passado, no qual Peter e sua equipe observaram o processo pelo qual nossas células cortam uma cadeia maior de RNA – que codifica uma proteína do ciclo de morte celular chamada CD95L – em várias siRNAs.

Em uma série de experimentos, eles mostraram que o mesmo maquinário celular poderia ser usado para converter outros grandes RNAs codificadores de proteínas em siRNAs. Os pesquisadores descobriram também que cerca de 3% de todos os RNAs de codificação em nosso genoma poderiam ser processados ​​para servir a esse propósito.

“Agora que sabemos o código, podemos acionar o mecanismo sem ter que usar quimioterapia e sem mexer no genoma”, celebra Peter em um comunicado à imprensa publicado no Eurekalert no mês passado.

Em outro estudo sobre a descoberta publicado no ano passado, a mesma equipe da Northwestern usou nanopartículas para fornecer siRNAs como estas às células de tumores de ovário humanos que haviam sido implantados em camundongos. O tratamento resultou em uma redução profunda no crescimento do tumor, sem efeitos colaterais prejudiciais. O trabalho para aumentar a eficiência da terapia já está em andamento.

“Com base no que aprendemos nesses vários estudos anteriores, agora podemos projetar micro RNAs artificiais que são muito mais poderosos para matar células cancerosas do que os desenvolvidos pela natureza”, aponta Peter.

Gatilho contra o câncer

“Desde que a vida se tornou multicelular, o que pode ter acontecido mais de 2 bilhões de anos atrás, ela teve que lidar com a prevenção ou o combate ao câncer. Portanto, a natureza deve ter desenvolvido um mecanismo seguro contra falhas para prevenir o câncer ou combatê-lo no momento em que se forma. Caso contrário, não estaríamos mais aqui”, explica o pesquisador.

Peter então começou sua busca por moléculas naturais codificadas no genoma que matam o câncer há oito anos. “Sabíamos que seria muito difícil encontrar. O mecanismo só estaria ativo em uma única célula no momento em que ela se tornasse cancerosa. Era uma agulha num palheiro.”

Mas ele as encontrou testando os siRNAs, usados originalmente para suprimir atividade genética. Estes pequenos RNAs são projetados tornando sequências curtas do gene a ser direcionado em RNA de cadeia dupla. Esses siRNAs, quando introduzidos nas células, suprimem a expressão do gene do qual são derivados.

A equipe descobriu que um grande número desses pequenos RNAs derivados de certos genes não suprimia, como esperado, apenas o gene contra o qual foram projetados. Eles também matavam todas as células cancerígenas. Essas sequências especiais estão distribuídas por todo o genoma humano, incorporadas em vários genes.

Quando convertidas em siRNAs, essas sequências agem como super-assassinos altamente treinados. Eles matam as células, eliminando simultaneamente os genes necessários para a sobrevivência celular. Ao eliminar esses genes sobreviventes, a molécula assassina ativa várias vias celulares da morte em paralelo – o tiro, a facada e o pulo do prédio.

As pequenas moléculas de RNA-assassino desencadeiam um mecanismo que Peter chama de DISE, sigla em inglês para Morte Induzida pela Eliminação do Gene de Sobrevivência. A ativação da DISE em organismos com câncer pode permitir que as células cancerígenas sejam eliminadas. E o que é melhor: a equipe tem evidências de que essa forma de morte celular afeta preferencialmente células cancerígenas, com pouco efeito sobre as células normais.

Descobertas disruptivas

Peter teve a ajuda de Shad Thaxton, professor associado de urologia da escola de medicina da Universidade Northwestern, para testar este procedimento em um ambiente de tratamento. Eles levaram as moléculas assassinas via nanopartículas a camundongos com câncer de ovário humano. Nos ratos tratados, o tratamento reduziu fortemente o crescimento do tumor sem toxicidade para os camundongos e os tumores não desenvolveram resistência a esta forma de tratamento. Peter e Thaxton estão agora refinando o tratamento para aumentar sua eficácia.

Esta nova forma de atacar o câncer pode ser revolucionária, considerando que as terapias atuais, mesmo aquelas que atacam células específicas, possuem muitas falhas, segundo Peter. “O problema é que as células cancerígenas são tão diversas que, embora as drogas, destinadas a atacar genes cancerígenos únicos geralmente sejam eficazes, acabam parando de funcionar e os pacientes sucumbem à doença”, aponta o pesquisador. Ele acredita que vários subgrupos de células cancerígenas nunca são realmente afetados pela maioria dos medicamentos anticâncer usados ​​atualmente.

“Nossa pesquisa pode estar tocando em um dos interruptores matemáticos originais da natureza, e esperamos que o impacto afete muitos tipos de câncer. Nossas descobertas podem ser disruptivas”, define Peter.


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