Entendamos a controvérsia:
As notícias "Comissão da Câmara pode derrubar reeleição majoritária e eleição de 2018" e "Rodrigo Maia abre caminho para cancelar as eleições de 2018", decorrentes do Ato da Presidência da Câmara dos Deputados, de 3 de maio de 2017, proferido no processo atinente à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 77/2003 (Ementa: "Suprime o § 5º do art. 14 e dá nova redação ao § 1º do art. 27, ao caput do art. 28, ao inciso I do art. 29, ao parágrafo único do art. 44, aos §§ 1º e 2º do art. 46 e ao caput do art. 82, para pôr fim à reeleição majoritária, determinar a simultaneidade das eleições e a duração de cinco anos dos mandatos para os cargos eletivos, nos níveis federal, estadual e municipal, nos Poderes Executivo e Legislativo"), sintetizam a cizânia.
Mas, mesmo assim, podemos resumir o questionamento que está "bombando na internet" em uma só pergunta: a aprovação da unificação das eleições brasileiras (municipais, estaduais, distritais e federais) em uma única data abriria margem para que fossem "puladas" as eleições de 2018, realizando-se novo pleito, desta feita unificado, apenas em 2020?
Tal dúvida, obviamente, supõe que haveria prorrogação dos mandatos que venceriam em 2018 até 2020.
Pois bem.
A referida PEC 77 foi proposta em 2003. No seu texto, a unificação da data das eleições brasileiras seria implementada por meio de um processo lento e gradual:
Art. 3º O disposto no art. 29, inciso I, da Constituição Federal, quanto à duração de cinco anos dos mandatos, será aplicado às eleições municipais a partir de 2010, observado o disposto no art. 4º.
Art. 4º Os mandatos dos candidatos eleitos nos pleitos municipais de 2004 serão de seis anos.
Art. 5º O disposto nos arts. 27, § 1º, 28, caput, 44, parágrafo único, art. 46, §§ 1º e 2º e 82 da Constituição Federal, quanto à duração de cinco anos dos mandatos e a renovação qüinqüenal do Senado Federal só será aplicado às eleições estaduais e federais a partir de 2010.
Art. 6º Os mandatos dos candidatos eleitos nos pleitos estaduais e federais até as eleições de 2006, inclusive, serão de quatro anos, observado o disposto no art. 7º desta Emenda.
Art. 7º Os mandatos dos Senadores eleitos até 2006, inclusive, serão de nove.
Como se observa, pela ideia original da proposição, nenhum político já eleito ganharia mais tempo de mandato. As "regras do jogo" não mudariam "durante a partida", portanto.
Um trecho da justificativa da PEC torna as coisas ainda mais claras:
A fim de evitar incorrer em vício de constitucionalidade, não estamos propondo a prorrogação dos 5 mandatos, estamos criando regras de transição que fazem paulatinamente o ajuste para que a partir de 2014 todas as eleições possam ocorrer simultaneamente.
Entretanto, caso a referida PEC avance, certamente seu texto passará por modificações ao longo do processo legislativo.
Desse modo, não é impossível - talvez seja até mesmo provável -, diante do que vem fazendo principalmente a Câmara dos Deputados, que uma prorrogação de mandatos dos atuais políticos seja aprovada (ainda mais se considerarmos os riscos que muitos políticos correm de não se reelegerem por decorrência da "Operação Lava Jato").
Se serve de consolo, indubitavelmente, tal prorrogação seria inconstitucional.
Nem mesmo uma emenda à constituição poderia pretender tal feito prorrogativo, pois terminaria afrontando cláusulas pétreas da Constituição Federal de 1988, tais como o princípio do Estado Democrático de Direito e da periodicidade do voto (art. 1º, caput, e art 60, § 4º, II e IV, ambos da Constituição Federal). Isso porque o voto popular é atribuído a determinado candidato para que este exerça seu mandato por certo período pré-determinado pela Constituição Federal. Entender em sentido contrário seria compreender pela legitimidade, por exemplo, de sucessivas emendas constitucionais prorrogarem o mandato do Presidente da República, o que por óbvio seria absurdo e institucionalizaria/"legalizaria" uma ditadura. Assim, a legitimação e o mandato dos políticos eleitos em 2014 (e dos senadores eleitos em 2010) termina em 2018 e ponto. Somente nova votação popular pode outorgar novo período de representação a eles.
Em resposta ao questionamento inicial ("querem acabar com as eleições de 2018 e prorrogar o mandato de Temer?"), respondemos que, se existisse plena sanidade político-jurídica no Brasil, sem dúvidas tudo não passaria de um MITO.
Mas, como se sabe, hoje em dia tudo parece possível. Fiquemos atentos.
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