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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Eles não vivem sem celular

O jovem é o grande desbravador dessa tecnologia.  Mais que um 
telefone, o aparelho virou um item definidor de sua personalidade.



Cena número 1: uma turma de adolescentes reunidos na área de lazer de um shopping center ou durante o recreio no colégio, todos falando pelo celular ao mesmo tempo. Cena número 2: numa casa noturna, garotos e garotas a poucos metros uns dos outros se azaram por meio de torpedos – as mensagens de texto enviadas pelo telefone. Já faz algum tempo que situações como essas se tornaram corriqueiras nos grandes centros do país. Assim como ocorreu no Japão ou nos Estados Unidos, os celulares viraram itens de consumo essenciais para uma parcela significativa dos jovens brasileiros. Uma pesquisa do Instituto Ipsos em nove capitais mostra que a proporção de adolescentes que possuem o aparelho saltou de 31% em 2002 para 38% no ano passado. De acordo com o Ibope, os jovens de 16 a 24 anos já representam um quarto dos usuários de celulares nos onze maiores mercados do país. Mais que qualquer outro grupo social, são eles que abraçam a tecnologia com maior entusiasmo. Numa época em que os celulares deixaram de ser meros telefones para se tornar engenhocas de caráter multimídia, capazes de gravar e enviar imagens e até baixar músicas da internet, os adolescentes assumiram o papel de desbravadores. Enquanto muitos adultos ficam atônitos com os recursos cada vez mais avançados dos aparelhos, estima-se que no Brasil os jovens sejam responsáveis por algo próximo de 90% do uso de serviços diferenciados, como as mensagens de texto. Mas não é só isso: a juventude está imersa numa certa cultura da era do celular. A linguagem cifrada dos torpedos, repleta de figuras de expressão e abreviaturas, é parte dela. Há até mesmo um reflexo físico sobre os jovens: eles desenvolveram uma destreza incrível para teclar mensagens no telefone em alta velocidade, com uma mão só.

Nascida e criada em plena explosão do uso do celular, a geração atual é protagonista de uma revolução de comportamento. O celular alterou facetas da relação entre jovens e pais. Com seu advento, esses últimos passaram a ter a possibilidade de monitorar seus filhos em qualquer horário e lugar. Isso teve uma contrapartida: como os pais ficaram mais tranqüilos em relação às saídas de seus rebentos, os jovens ganharam autonomia. O celular representou também uma forma de os adolescentes aumentarem sua privacidade. Eles preferem que os amigos liguem para seu aparelho, e não para o telefone fixo de casa. As conversas por meio dos torpedos também ajudam a manter seus assuntos fora da órbita dos adultos. Na escola, no entanto, os torpedos têm sido utilizados para um fim dos mais condenáveis: a cola. A coisa ficou tão brava que os colégios estão proibindo seus alunos de portar celulares nas aulas.

De acordo com uma pesquisa entre consumidores japoneses, a posse de um celular atende a um desejo do jovem de estar conectado a alguém o tempo todo. As operadoras registram o pico de tráfego de mensagens de texto à noite, quando os adolescentes participam de salas de bate-papo e azaração que são acessadas por meio desse serviço. A carioca Camilla Moreira Rebello, de 15 anos, é uma usuária contumaz. A estudante, que ganhou seu primeiro celular há quatro anos e desde então trocou de aparelho seis vezes, hoje tem um cuja tecnologia lhe permitiu criar uma página pessoal na internet – ou seja, ela mantém um blog pelo celular. Todo o texto e as fotografias que aparecem no site foram criados e colocados na rede por meio do aparelho, graças a um serviço oferecido por sua operadora. "Fico plugada em meu blog e nas salas de bate-papo em qualquer situação, até quando saio com meus amigos", diz Camilla, cuja conta telefônica já chegou a 500 reais em um mês.

No mundo inteiro, os gastos dos jovens com os celulares têm sido limitados em razão dos preços, já que boa parte desses consumidores depende de mesada. Tornou-se clássico o celular "pai-de-santo" – aparelho pré-pago que só recebe chamadas, pois não dispõe de créditos. Mas a carteira curta não impede que os jovens fiquem ligados nas últimas novidades e elejam os modelos mais avançados como objetos de desejo. Para esse público, o celular passou a representar um acessório definidor da personalidade. Um indício disso é o comportamento das garotas que consomem com voracidade capas coloridas, adesivos, chaveiros – tudo que confira ao celular a sua cara. Ambos os sexos também são seduzidos pelos toques de campainha que se podem baixar no celular. "A compulsão por esses toques é uma busca de personalização e se verifica mesmo entre as patricinhas, a mais padronizada de todas as tribos", diz a psicanalista Diana Corso.

A venda de trechos de músicas para uso como campainha é um dos serviços mais populares da telefonia celular. E os jovens são a força motriz desse mercado. Prova disso é que o ranking das canções mais procuradas é dominado por artistas bem cotados entre eles, como Charlie Brown Jr. e Felipe Dylon. A alta procura – são 4 milhões de acessos a esse tipo de serviço por mês – fez da principal fornecedora de canções para celulares, a empresa mineira Takanet, uma das maiores pagadoras de direitos autorais do país. Não é difícil entender por que isso ocorre: como os modismos juvenis são efêmeros, as operadoras precisam disponibilizar novas músicas para seus clientes a toda hora. O adolescente não resiste aos encantos do celular – mas o mercado de celulares também tem de se curvar a seus caprichos.

NOTA: Apesar desta repostagem ser da Veja Jovem de 2004, ela ainda retrata o perfil do jovem consumidor da atualidade. Em breve traremos outras postagens atuais tratando deste assunto.

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